Classes de conjugação
Considere a ação de \(G\) em \(\Omega=G\) por conjugação já estudada no Exemplo 79.5; ou seja, \((x,g)\mapsto x^g=g^{-1}xg\). Se \(x\in \Omega\) então a órbita \(x^G=\{x^g \mid g\in G\}\) é chamada de classe de conjugação de \(x\) em \(G\). O estabilizador de \(x\in \Omega\) nesta ação é o subgrupo \[\begin{eqnarray*}
G_x&=&C_G(x)=\{g\in G\mid g^{-1}xg= x\}\\&=&\{g\in G\mid xg= gx\}.
\end{eqnarray*}\] Este subgrupo chama-se o centralizador de \(x\) em \(G\). Temos pelo Teorema Órbita-Estabilizador que \(|x^G|=|G:C_G(x)|\). Em particular, se \(G\) é finito, obtemos o seguinte resultado.
Proposição 80.1 Se \(G\) é um grupo finito e \(x\in G\), então \[
|x^G|=\frac{|G|}{|C_G(x)|}.
\]
Classes de conjugação em \(S_n\)
Definição 80.1 Se \(n\in\N\), então uma partição de \(n\) é uma sequẽncia \(\lambda=(k_1,\ldots,k_m)\) tal que \(k_1\geq k_2\geq\cdots\geq k_m\) e \(k_1+\cdots+k_m=n\). Neste caso escrevemos que \(\lambda\vdash n\).
Exemplo 80.1 Por exemplo, as partições de \(5\) são \[
(1,1,1,1,1),\ (2,1,1,1),\ (2,2,1),\ (3,1,1),\ (3,2),\ (4,1),\ (5)
\]
Partições são importantes em várias áreas da matemática e estatística. O número de partições de um inteiro \(n\) aparece como a sequência A000041 na Online Encyclopedia of Integer Sequences.
Exemplo 80.2 Cada permutação \(\sigma\in S_n\) determina uma partição de \(n\). De fato, assuma que \(\sigma\) é produto de ciclos de comprimento \(\lambda_1,\ldots,\lambda_m\), em ordem não crescente, contando também os ciclos de comprimento \(1\). Então \(\lambda=(\lambda_1,\ldots,\lambda_m)\vdash n\). Por exemplo, a partição determinada pela permutação \((1,2)(3,4)(5,6,7)\in S_8\) é \((3,2,2,1)\).
Exercício 80.1 Se \((i_1,\ldots,i_k)\in S_n\) é um ciclo e \(\sigma\in S_n\), então \[
(i_1,\ldots,i_k)^\sigma=(i_1\sigma,\ldots,i_k\sigma).
\] Demonstre que \(\sigma_1,\sigma_2\in S_n\) são conjugados em \(S_n\) se e somente eles determinam a mesma partição de \(n\).
Exemplo 80.3 Considere o grupo \(S_5\). Pelo Exemplo 80.1, este grupo tem 7 classes de conjugação com os seguintes representantes: \(1\), \((1,2)\), \((1,2)(3,4)\), \((1,2,3)\), \((1,2,3)(4,5)\), \((1,2,3,4)\), e \((1,2,3,4,5)\). Note que cada classe corresponde a uma partição no Exemplo 80.1. A seguinte tabela contém as cardinalidades destas classes, as cardinalidades do centralizador do representante, e geradores do centralizador.
\(1\) |
\(1\) |
\(120\) |
\(S_5\) |
\((1,2)\) |
\(10\) |
\(12\) |
\(\left<(1,2),(3,4),(3,4,5)\right>\) |
\((1,2)(3,4)\) |
\(15\) |
\(8\) |
\(\left<(1,2),(1,3,2,4)\right>\) |
\((1,2,3)\) |
\(20\) |
\(6\) |
\(\left<(1,2,3),(4,5)\right>\) |
\((1,2,3)(4,5)\) |
\(20\) |
\(6\) |
\(\left<(1,2,3),(4,5)\right>\) |
\((1,2,3,4)\) |
\(30\) |
\(4\) |
\(\left<(1,2,3,4)\right>\) |
\((1,2,3,4,5)\) |
\(24\) |
\(5\) |
\(\left<(1,2,3,4,5)\right>\) |
Exercício 80.2 Determine as tabelas das classes de comjugação para os grupos \(S_3\), \(S_4\), e \(S_6\).
O centro de um grupo
O centro \(Z(G)\) de um grupo \(G\) foi definido na Definição 77.7 como \[\begin{eqnarray*}
Z(G)&=&\{g\in G\mid gh=hg\mbox{ para todo }h\in G\}\\&=&\{g\in G\mid g^h=g\mbox{ para todo }h\in G\}.
\end{eqnarray*}\]
Para \(g\in G\), observe que \(\{g\}\) é uma classe de conjugação se e somente se \(g\in Z(G)\). (Pode-se deduzir da tabela em cima que \(Z(S_5)=\{1\}\).) Se \(G\) é um grupo finito e \(C_1,\ldots,C_m\) são as classes de \(G\) com cardinalidade maior ou igual a dois, então podemos escrever o grupo \(G\) como uma união disjunta \[
G=Z(G)\cup C_1\cup\cdots\cup C_m
\] e isso implica que \[
|G|=|Z(G)|+ |C_1|+\cdots+|C_m|.
\tag{80.1}\] A equação Equação 80.1 é chamada de equação das classes de \(G\).
Considerando a equação das classes para grupos cuja ordem é uma potência de um primo, obtemos o seguinte resultado importante.
Teorema 80.1 Seja \(p\) um primo e seja \(G\) um grupo tal que \(|G|=p^k\) com algum \(k\geq 1\). Então o centro \(Z(G)\) é não trivial (ou seja, \(|Z(G)|>1\)).
Comprovação. Considere a equação Equação 80.1 para o grupo \(G\). Como as classes \(C_i\) são \(G\)-órbitas para uma ação de \(G\) (nomeadamente, a conjugação de \(G\) em \(G\)), temos que \(|C_i|\) é um divisor de \(|G|=p^k\); ou seja \(|C_i|=p^{k_i}\) com algum \(k_i\geq 1\). O lado esquerdo da equação das classes é uma potência de \(p\), e os termos \(|C_i|\) no lado direito também são potências de \(p\). Isso quer dizer que \(p\mid |Z(G)|\) e em particular que \(|Z(G)|>1\).
Note que um grupo finito \(G\) tal que \(|G|=p^k\) onde \(p\) é primo é chamado de \(p\)-grupo finito. Por exemplo, \(D_4\) é um 2-grupo finito. O teorema anterior diz que o centro de um \(p\)-grupo finito é não trivial.
Exercício 80.3 Sejam \(p\) um primo e \(G\) um grupo tal que \(|G|=p^2\). Mostre que \(G\) é abeliano e que exatamente uma das seguintes afirmações é válida:
- \(G\) é cíclico e \(G\cong \Z_{p^2}\);
- \(G=\left<a,b\right>\) onde \(|a|=|b|=p\) e \(ab=ba\). Neste caso \(G\cong \Z_p\times \Z_p\).
Primeiro encontro com grupos solúveis
Definição 80.2 Um grupo \(G\) chama-se solúvel se \(G\) possui uma cadeia de subgrupos \[
G_0=1<G_1<\cdots<G_{k}<G_{k+1}=G
\] tal que \(G_i\) é normal em \(G_{i+1}\) (para todo \(i\)) e cada quociente \(G_{i+1}/G_{i}\) é abeliano.
Exemplo 80.4 Os seguintes grupos são solúveis.
- Grupos abelianos.
- Grupos diedrais.
- \(S_4\).
Grupos solúveis são chamados assim, pois eles correspondem a equações polinomiais que são resolúveis por radicais. As equações polinomiais de grau 2, 3, 4 são resolúveis por radicais porque os grupos \(S_2\), \(S_3\), e \(S_4\) são solúveis. Nós vamos ver na aula seguinte que \(S_5\) não é um grupo solúvel e isso implica (de modo não trivial) que as equações polinomiais de grau 5 não são resolúveis por radicais.
Corolário 80.1 Um \(p\)-grupo finito \(G\) é solúvel.
Comprovação. Seja \(G\) um \(p\)-grupo. Ponha \(Z_0=1\). Pelo Teorema 80.1, temos que \(Z_1=Z(G)\neq 1\). Se \(Z(G)=G\), então \(G\) é abeliano e é solúvel. Assuma que \(Z(G)\neq G\) e considere o quociente \(G/Z(G)\) (que é não trivial). Este grupo é um \(p\)-grupo também e \(Z(G/Z(G))\neq 1\). Pelo Teorema 77.3, temos que existe um subgrupo normal \(Z_2\unlhd G\) tal que \(Z(G)< Z_2\) e \(Z(G/Z(G))=Z_2/Z_(G)\). Continuando deste jeito, assuma que foi determinado uma cadeia de subgrupos normais \(Z_0<Z_1<Z_2<\cdots<Z_k\) tal que \[
Z(G/Z_{i-1})=Z_i/Z_{i-1}\quad\mbox{para todo}i\in\{1,\ldots,k\}
\] Se \(Z_k=G\), então não temos nada mais para fazer. Se \(Z_k<G\), então defina \(Z_{k+1}\) usando o Teorema 77.3 tal que \(Z(G/Z_k)=Z_{k+1}/Z_k\). Como \(G/Z_k\) é um \(p\)-grupo finito, temos por Teorema 80.1 que \(Z_k<Z_{k+1}\).
Como \(G\) é finito, obtemos uma cadeia de subgrupos \[
Z_0=1<Z_1<\cdots<Z_m=G
\] com a propriedade que \(Z(G/Z_{i-1})=Z_{i}/Z_{i-1}\) para todo \(i\in\{1,\ldots,m\}\). Como o centro de qualquer grupo é abeliano, obtemos que todo quociente \(Z_i/Z_{i-1}\) é abeliano e \(G\) é solúvel.
A cadeia construída na demonstração do Corolário 80.1 chama se cadeia central superior de \(G\). O argumento na demonstração na verdade demonstra que um \(p\)-grupo finito \(G\) é nilpotente (veja Capítulo 87) que é uma propriedade mais forte que ser solúvel.
Existem vários teoremas notáveis sobre grupos solúveis. Talvez o mais famoso é o Teorema de Feit-Thompson (tambem conhecido como o Teorema da Ordem Ímpar) que é o seguinte.
Teorema 80.2 (Feit-Thompson, 1963) Se \(G\) é um grupo finito de ordem ímpar, então \(G\) é solúvel.
Este é um teorema profundo, a sua demonstração original ocupa mais que 200 páginas na revista Pacific Journal of Mathematics. John Thompson recebeu Medalha de Fields em 1970 por sua contribuição à teoria dos grupos finitos.