52  Bases de espaços vetoriais

Nesta página, não distinguimos entre cardinalidades infinitas.

Lema 52.1 Assuma que \(V\) é um espaço vetorial e sejam \(X,Y\subseteq V\) tais que \(X\) é L.I. e \(Y\) é gerador. Então \(|X|\leq |Y|\).

Comprovação. Não há nada para provar quando \(Y\) é infinito, então assuma que \(Y\) é finito. Seja \(Y=\{y_1,\ldots,y_k\}\). Assuma com o objetivo de achar uma contradição que \(|X|>|Y|=k\).

Assuma que \(x_1\in X\). Como \(X\) é L.I., \(x\neq 0\). Como \(Y\) é conjunto gerador, \[ x_1=\sum_{i=1}^k \alpha_iy_i\quad\mbox{com}\quad \alpha_i\in\F. \] Como \(x_1\neq 0\), pelo menos um \(\alpha_i\) é diferente de zero e podemos assumir sem perder generalidade que \(\alpha_1\neq 0\). Neste caso, \[ y_1=(1/\alpha_1)x_1-\sum_{i=2}^n(\alpha_i/\alpha_1) y_i. \] Portanto, \(y_1\) é combinação linear de \(x_1,y_2,\ldots,y_k\). Se \(v\in V\) é arbitrário, então \(v\) pode ser escrito como combinação linear dos \(y_i\) e assim \[ v=\sum_{i=1}^n\beta_iy_i = \beta_1\left((1/\alpha_1)x_1-\sum_{i=2}^n(\alpha_i/\alpha_1) y_i\right)+\sum_{i=2}^n\beta_i y_i \] Ou seja, \(v\) também é combinação linear de \(x_1,y_2,\ldots,y_k\) Como \(v\) foi arbitrário, o conjunto \(Y_1=\{x_1,y_2,\ldots,y_k\}\) é um conjunto gerador.

Escolha agora \(x_2\in X\setminus\{x_1\}\). Como \(Y_1\) é sistema gerador, podemos escrever \[ x_2=\alpha_1 x_1+\sum_{i=2}^n\alpha_i y_i. \] (Aqui os coeficientes \(\alpha_i\) são diferentes dos coeficientes na linha em cima.) Como \(x_2\neq 0\), temos que algum coeficiente \(\alpha_i\) é não nulo. Além disso, como \(x_1,x_2\) são L.I., podemos escolher \(i\geq 2\). Assuma sem perder generalidade que \(\alpha_2\neq 0\). Neste caso, pode-se escrever que \[ y_2=(1/\alpha_2)x_2-(\alpha_1/\alpha_2)x_1-\sum_{i=3}^n(\alpha_i/\alpha_2)y_i. \] Usando o argumento em cima, obtemos que \(Y_2=\{x_1,x_2,y_3,\ldots,y_k\}\) é conjunto gerador.

Continuando desse jeito, obtemos que \(Y_k=\{x_1,\ldots,x_k\}\) é um conjunto gerador de \(V\). Mas como \(|X|>k\), temos que existe \(x\in X\setminus\{x_1,\ldots,x_k\}\) e podemos escrever \[ x=\gamma_1x_1+\cdots+\gamma_k x_k. \] Mas isso dá \[ 0=x-\gamma_1x_1-\cdots-\gamma_kx_k \] o que é impossível, pois \(X\) é L.I. Obtivemos que a suposição \(|X|>|Y|=k\) nos levou a um absurdo, logo a única alternativa sensata é que \(|X|\leq |Y|\).

Corolário 52.1 Se \(B_1\) e \(B_2\) são bases do mesmo espaço vetorial, então \(|B_1|=|B_2|\).

Comprovação. Como \(B_1\) é L.I. e \(B_2\) é gerador, temos que \(|B_1|\leq |B_2|\). Trocando \(B_1\) e \(B_2\), temos que \(|B_2|\leq |B_1|\). Logo, \(|B_1|=|B_2|\).

Definição 52.1 Seja \(V\) um espaço vetorial não nulo e seja \(B\) uma base de \(V\). A dimensão de \(V\) está definida como a cardinalidade \(|B|\) e está denotada \(\dim V\). Quando \(V=0\), \(\dim V=0\).

Pelo corolário em cima, a dimensão de \(V\) não depende da base escolhida.

Exemplo 52.1 Nos seguintes exemplos, \(\F\) é um corpo arbitrário.

  • \(\dim\F^n=n\), pois a base canônica possui \(n\) elementos.
  • \(\dim M_{m\times n}(\F)=mn\), pois as matrizes elementares \(e_{i,j}\) com \(i\in\{1,\ldots,m\}\), \(j\in\{1,\ldots,n\}\) formam uma base.
  • Se \(k\geq 0\), então \(\dim\F[x]_k=k+1\), pois \(\{1,x,x^2,\ldots,x^k\}\) é uma base.
  • \(\dim\F[x]=\infty\) pois \(\{1,x,x^2,\ldots,\}\) é uma base.
  • \(\dim\F[[x]]=\infty\), pois o conjunto no ponto anterior é L.I., e pode ser estendido a uma base de \(\F[[x]]\).
  • Se \(X\) é um conjunto finito, então \(\dim\mbox{Func}(X,\F)=|X|\). Definindo as funções \(f_x:X\to \F\) com \(f_x(y)=1\) se \(x=y\) e \(f_x(y)=0\) caso contrário, temos que \(\{f_x\mid x\in X\}\) é uma base.

No caso de espaços de dimensão finita, é mais fácil verificar se um sistema é base ou não.

Teorema 52.1 Seja \(V\) um espaço de dimensão \(k\) e \(X=\{v_1,\ldots,v_k\}\) um sistema de \(k\) vetores. As seguintes são equivalentes:

  • \(X\) é base;
  • \(X\) é L.I.;
  • \(X\) é gerador.

Comprovação. Exercício.