62  Projeções

Definição 62.1 Uma transformação \(f\in\mbox{End}(V)\) chama-se projeção (ou idempotente em outros contextos) se \(f^2=f\).

Definição 62.2 Seja \(f\in\mbox{End}(V)\) e \(U\leq V\). O subespaço \(U\) chama-se \(f\)-invariante se \(f(u)\in U\) para todo \(u\in U\). Neste caso a restrição \(f|_U:U\to U\) é uma transformação linear de \(U\); ou seja \(f|_U\in\mbox{End}(U)\).

Seja \(V=U\oplus W\) uma decomposição para soma direta. Se \(v\in V\), então \(v\) pode ser escrito unicamente como \(v=u+w\) com \(u\in U\) e \(w\in W\) e pode-se definir \(f:V\to V\) como \(f(v)=u\). O endomorfismo \(f\) é uma projeção tal que \(\mbox{Im}(f)=U\) e \(\ker f=W\).

Lema 62.1 As seguintes afirmações são válidas para uma projeção \(f:V\to V\).

  • \(\mbox{Im}(f)\) é \(f\)-invariante e \(f|_{\textrm{Im}(f)}=\mbox{id}_{\textrm{Im}(f)}\).
  • Os possíveis autovalores de \(f\) são \(1\) e \(0\).
  • \(f\) é raiz do polinômio \(t^2-t\) e \(m_f(t)\in\{t,t-1,t^2-t\}\).
  • \(V_0=\ker f\), enquanto \(V_1=\ker(\mbox{id}_V-f)=\mbox{Im}(f)\).
  • \(V=V_0\oplus V_1=\ker f\oplus\ker(\mbox{id}_V-f)\).

Comprovação.

  1. Segue da definição. Para provar 2., assuma que \(\lambda\) é autovalor com autovetor não nulo \(v\). Tem-se que \[ \lambda^2 v=f(f(v))=f^2(v)=f(v)=\lambda v. \] Logo \(\lambda^2=\lambda\) ou seja \(\lambda\in\{0,1\}\).

  2. A definição da projeção implica que \(f\) é raiz de \(t^2-t\). Logo \(m_f(t)\) é um divisor de \(t^2-t\) e as possibilidades são \(t\), \(t-1\), \(t^2-t\).

  3. \(V_0=\ker f\) e \(V_1=\ker(\mbox{id}_V-f)\) valem para qualquer \(f\) (não precisa ser projeção). Se \(f(v)\in \mbox{Im}(f)\), então \(f(f(v))=f(v)\) e \(f(v)\in V_1\). Vice versa, se \(v\in V_1\), então \(v=f(v)\in \mbox{Im}(V)\). Logo \(V_1=\mbox{Im}(V)\).

  4. Para concluir que \(V=\mbox{Im}(f)+\ker f\), escreva \(v\in V\) como \(v=v-f(v)+f(v)\) e note que \(v-f(v)\in\ker f\). Como \(\ker f\) e \(\mbox{Im}(f)\) são autoespaços com autovalor distinto, temos que \(\ker f\cap \mbox{Im}(f)=0\). Portanto \(V= \mbox{Im}(f)\oplus\ker f\).

Se \(V=V_1\oplus\cdots\oplus V_k\), pode-se definir \(p_i:V\to V\) por \[ p_i(v)=v_i \] onde \(v=v_1+\cdots+v_k\) com \(v_i\in V_i\). Definindo assim, temos que \(p_i\) é uma projeção para cada \(i\), \(p_1+\cdots+p_k=\mbox{id}_V\) e \(p_ip_j=0\) quando \(i\neq j\). O teorema seguinte diz que este argumento pode ser revertido.

Teorema 62.1 Sejam \(p_1,\ldots,p_k:V\to V\) tais que

  • \(p_1+\cdots+p_k=\mbox{id}_V\);
  • \(p_ip_j=0\) para todo \(i\neq j\).

Então os \(p_i\) são projeções e \(V=\mbox{Im}(p_1)\oplus\cdots\oplus\mbox{Im}(p_k)\).

Comprovação. Temos para \(v\in V\) que \[\begin{align*} p_i(v)&=p_i(\mbox{id}_V(v))=p_i((p_1+\cdots+p_k)(v))=p_i(p_1(v)+\cdots+p_k(v))\\ &=p_i(p_1(v))+\cdots+p_i(p_i(v))+\cdots+p_i(p_k(v))=p_i(p_i(v)). \end{align*}\] Logo \(p_i^2=p_i\) e \(p_i\) é uma projeção.

Se \(v\in V\), então \[ v=\mbox{id}_V(v)(p_1+\cdots+p_k)(v)=p_1(v)+\cdots+p_k(v)\in \mbox{Im}(p_1)+\cdots+\mbox{Im}(p_k). \] Para provar que a soma é direta, seja \(p_i(v)\in\mbox{Im}(p_i)\cap\sum_{j\neq i}\mbox{Im}(p_j)\) e escreva \[ p_i(v)=p_1(v_1)+\cdots+p_{i-1}(v_{i-1})+p_{i+1}(v_{i+1})+\cdots+p_k(v_k). \] Ora, \[\begin{align*} p_i(v)&=p_i(p_i(v))=p_i(p_1(v_1)+\cdots+p_{i-1}(v_{i-1})+p_{i+1}(v_{i+1})+\cdots+p_k(v_k))\\&=0. \end{align*}\] Portanto, \(\mbox{Im}(p_i)\cap\sum_{j\neq i}\mbox{Im}(p_j)=0\) e a soma é direta.