3  Quantificadores

3.1 Predicatos

Um predicato é um sentença com variáveis. Por exemplo \[ P(x):\mbox{$x$ é par} \]
é um predicato com variável \(x\). Neste caso, podemos substituir objetos no lugar de \(x\). Por exemplo, substituindo \(x=2\), obtemos a proposição verdadeira \[ P(2): \mbox{$2$ é par}. \] Se substituimos \(x=3\), então obtemos a proposição \[ P(3): \mbox{3 é par} \] que é uma proposição falsa. Se substituimos \(x=\pi\), então \[ P(\pi): \mbox{$\pi$ é par} \] não obtemos uma proposição válida, pois o conceito de ser par não faz sentido para o número \(\pi\).

Definição 3.1 Sejam \(P(x)\) um predicato e \(A\) um conjunto. Dizemos que o predicato \(P(x)\) é válido para \(A\) se \(P(a)\) é uma proposição (falsa ou verdadeira) para todo \(a\in A\).

Exemplo 3.1 Por exemplo, a predicato ‘\(P(x)\): \(x\) é par’ é valido para o conjunto \(\N\) de números naturais, pois cada natural ou é par ou é impar. Similarmente, o mesmo predicato é válido para o conjunto \(\Z\) dos inteiros, mas ele não é válido para o conjunto \(\Q\) de racionais, pois a propriedade de ser par não faz sentido para um número racional que não é inteiro.

3.2 Quantificador universal e existencial

Definição 3.2 Sejam \(A\) um conjunto e \(P(x)\) um predicato válido para \(A\). A proposição \[ \forall x\in A: P(x) \] (leia se: ‘para todo \(x\in A\), \(P(x)\)’) é verdadeira se \(P(x)\) é uma proposição verdadeira para todo \(x\in A\). Caso contrário a proposição \(\forall x\in A: P(x)\) é falsa.

A proposição \[ \exists x\in A: P(x) \] (leia se:‘existe \(x\in A\) tal que \(P(x)\)’) é verdadeira se \(P(x)\) é verdadeira para algum \(x\in A\). Caso contrário a proposição \(\exists x\in A: P(x)\) é falsa.

Exemplo 3.2 Seja \(A=\{2,3,5,7,11\}\) e seja ‘\(P(x)\): \(x\) é primo’. Então temos que a proposição \(\forall x\in A:P(x)\) é verdadeira. Consequentemente, a proposição \(\exists x\in A:P(x)\) é também verdadeira. Por outro lado, se ‘\(Q(x)\): \(x\) é par’, então \(\forall x\in A:Q(x)\) é falsa, mas \(\exists x\in A:Q(x)\) é verdadeira. Se ‘\(R(x)\): \(x\) é negativo’, então \(\forall x\in A:R(x)\) e \(\exists x\in A:R(x)\) são falsas.

3.3 Negação de proposições com quantificador

Considere a proposição \(\forall x\in A: P(x)\). Esta proposição afirma que a proposição \(P(x)\) está verdadeira para todo \(x\in A\). A negação dessa proposição afirma que isso não é verdade; ou seja, \(P(x)\) não é verdadeira para algum \(x\in A\). Portanto, \[ \neg(\forall x\in A: P(x))\equiv \exists x\in A:\neg P(x). \]

Exemplo 3.3 Considere \(A=\{-1,0,1\}\) e seja ‘\(P(x)\): \(x>0\)’. Temos que a proposição \(\forall x\in A: P(x)\) é falsa, pois tomando \(x=-1\), \(P(x)=P(-1)\) é falsa. Por outro lado \[ \neg (\forall x\in A:P(x))\equiv \exists x\in A:\neg P(x)\equiv \exists x\in A:x\leq 0 \] é verdadeira.

Similarmente, a negação da proposição \(\exists x\in A: P(x)\) é \(\forall x\in A: \neg P(x)\).

Exemplo 3.4 Considere \(A=\{-1,0,1\}\) e seja ‘\(P(x)\): \(x>0\)’. Temos que a proposição \(\exists x\in A: P(x)\) é verdadeira, pois tomando \(x=1\), \(P(x)=P(1)\) é verdadeira. Por outro lado \[ \neg (\exists x\in A:P(x))\equiv \forall x\in A:\neg P(x)\equiv \forall x\in A:x\leq 0 \] é falsa.

3.4 Proposições com várias quantificadores

Na matemática, precisamos estudar frequentemente proposições que têm várias quantificadores. Considere o seguinte exemplo.

Exemplo 3.5 Sejam \[ A=\{2,3,5,7\}\quad \mbox{e}\quad B=\{6,8,9,10,12,14\} \] e considere a proposição \[ \forall x\in A:(\exists y\in B:x\mid y). \] (Lembre que ‘\(x\mid y\)’ signfica que ‘\(y\) é múltiplo de \(x\)’; ou sejaj, ‘\(x\) é divisor de \(y\)’.) Esta proposição quer dizer que para todo \(x\in A\) existe \(y\in B\) tal que \(x\mid y\). Esta proposição é verdadeira pois cada elemento de \(A\) possui um múltiplo em \(B\). A negação desta proposição, pode ser escrita na maneira seguite: \[\begin{align*} \neg(\forall x\in A:(\exists y\in B:x\mid y))&\equiv\\ \exists x\in A:\neg (\exists y\in B:x\mid y)&\equiv\\ \exists x\in A:(\forall y\in B:x\nmid y). \end{align*}\]

Considere agora a proposição \[ \exists y\in B:(\forall x\in A:x\mid y). \] Esta proposição quer dizer que existe um elemento \(y\in B\) tal que \(y\) é múltiplo de todo elemento de \(A\). Inspeção dos dois conjuntos mostra que isso não é verdade. A negação desta proposição pode ser determinada com a seguinte conta: \[\begin{align*} \neg(\exists y\in B:(\forall x\in A:x\mid y))&\equiv\\ \forall y\in B:\neg (\forall x\in A:x\mid y)&\equiv\\ \forall y\in B:(\exists x\in A:x\nmid y). \end{align*}\]

Exemplo 3.6 Proposições com vários quantificadores são comuns na área de cálculo. Por exemplo, para uma sequência infinita \(a_1,a_2,a_2,\ldots\) de números reais, a definição que \(\lim_{n\to \infty}a_n=a\) é escrita na seguinte maneira: \[ \forall \varepsilon\in \R_+:(\exists N\in \N:(\forall n\in\{N,N+1,N+2,\ldots\}:|a-a_n|\leq \varepsilon)). \] Aqui \(\R_+\) é o conjunto dos números reais positivos. Esta mesma proposição está frequentamente escrita mais informalmente como \[ \forall \varepsilon>0:(\exists N>1:(\forall n\geq N:|a-a_n|\leq \varepsilon)). \] Geralmente, fica claro do contexto que \(\varepsilon\) é um número real, e \(N\) e \(n\) são números naturais.

A negação (ou seja, a afirmação que \(\lim_{n\to \infty}a_n\neq a\)) está escrita como \[ \exists\varepsilon\in\R_+:(\forall N\in\N:(\exists n\in\{N,N+1,N+2,\ldots\}:|a-a_n|>\varepsilon)). \] Mais informalmente, a negação está escrita como \[ \exists\varepsilon>0:(\forall N>1:(\exists n\geq N:|a-a_n|>\varepsilon)). \]