Exercícios: Topologia

$\newcommand{\N}{\mathbb N}\newcommand{\R}{\mathbb R}\newcommand{\Z}{\mathbb Z}\newcommand{\Q}{\mathbb Q}\newcommand{\A}{\mathcal A}$
1.  Seja $(x_n)$ uma sequência de números reais e seja $a\in\R$. Mostre que as seguintes são equivalentes.

  1. $x_n\rightarrow a$;
  2. para todo conjunto $X\subseteq \R$ aberto tal que $a\in X$ existe $N\in\N^+$ tal que $x_n\in X$ para todo $n\geq N$.

2. Sejam $A,\ B\subseteq \R$ conjuntos abertos. Mostre que
$$
A+B=\{a+b\mid a\in A,\ b\in B\}
$$
e
$$
A\cdot B=\{ab\mid a\in A,\ b\in B\}
$$
são abertos.

3. Sejam $X,Y\subseteq \R$ conjuntos fechados disjuntos tais que $X\cup Y$ é um intervalo fechado. Mostre que $X=\emptyset$ ou $Y=\emptyset$.

4. Seja $\alpha\in\R\setminus\Q$. Mostre que $\Z$ e $\alpha\Z$ são fechados, mas  $\Z+\alpha\Z$ não é fechado.

5. Demonstre as seguintes afirmações para conjuntos $A,B\subseteq \R$.

  1. Se $A$ é compacto e $B$ é fechado, então $A+B$ é fechado.
  2. Se $A$ e $B$ são compactos, então $A+B$ e $A\cdot B$ são compactos.
  3. Se $A$ é  compacto e $B$ é fechado, então pode ser que $AB$ não é fechado.

6. Demonstre que $(X\cup Y)’=X’\cup Y’$ para todo $X,Y\subseteq \R$.

7. Demonstre que se $X\subseteq \R$ é um conjunto limitado superiormente, então $\overline X$ também é.

8. Seja $\mbox{int}(X)$ o conjunto de pontos interiores de um conjunto $X\subseteq \R$. Mostre, para todo $X,Y\subseteq \R$, que $\mbox{int}(X\cap Y)=\mbox{int}(X)\cap \mbox{int}(Y)$ e $\mbox{int}(X\cup Y)\supseteq \mbox{int}(X)\cup \mbox{int}(Y)$. Mostre que a segunda desigualdade pode ser própria.

Limite de funções

$\newcommand{\N}{\mathbb N}\newcommand{\R}{\mathbb R}\newcommand{\Z}{\mathbb Z}\newcommand{\A}{\mathcal A}$Seja $X\subseteq\R$ um conjunto, $f:X\rightarrow\R$ uma função, e $a\in X’$. Dizemos que o limite da função $f$ no ponto $a$ é $L\in\R$ se para todo $\varepsilon>0$ existe $\delta>0$ tal que $|f(x)-L|\leq\varepsilon$ sempre que $0<|x-a|\leq\delta$. Escrevemos
$$
\lim_{x\rightarrow a}f(x)=L.
$$

Lema. Se existir $\lim_{x\rightarrow a}f(x)$, então ele é único.

Demonstração. Assuma que não e os reais distintos $L$ e $M$ são ambos limites de $f(x)$ em $a$. Seja $\varepsilon=|L-M|$. Existem $\delta_1$ e $\delta_2$ tais que
$$
|f(x)-L|\leq \varepsilon/3\quad\mbox{se}\quad 0<|x-a|\leq\delta_1
$$
e
$$
|f(x)-M|\leq \varepsilon/3\quad\mbox{se}\quad 0<|x-a|\leq\delta_2.
$$
Seja $\delta=\min\{\delta_1,\delta_2\}$ e $x\in X$ tal que $0<|x-a|\leq\delta$. Então
\begin{eqnarray*}
\varepsilon&=&|L-M|=|L-f(x)+f(x)-M|\\&\leq& |L-f(x)|+|f(x)-M|\leq 2\varepsilon/3.
\end{eqnarray*}
Isso é uma contradição, então $L=M$. $\Box$

Lema. Se existir $\lim_{x\rightarrow a}f(x)$, então existem $A>0$ e $\delta>0$ tal que $|f(x)|\leq A$ para todo $x\in X\cap (a-\delta,a+\delta)$.

Demonstração. Exercício.

Lema. Sejam $f,g,h:X\rightarrow\R$ e $a\in X’$ tais que $f(x)\leq g(x)\leq h(x)$ para todo $x\in X\setminus\{a\}$. Assuma que existem $\lim_{x\rightarrow a}f(x)$ e  $\lim_{x\rightarrow a}h(x)$ e
$$
\lim_{x\rightarrow a}f(x)=\lim_{x\rightarrow a}h(x)=L.
$$
Então existe $\lim_{x\rightarrow a}g(x)$ e é igual a $L$.

Demonstração. Seja $\varepsilon>0$. Existem $\delta_1,\delta_2>0$ tal que
$$
|f(x)-L|\leq \varepsilon\quad\mbox{se} \quad 0<|x-a|\leq\delta_1
$$
e
$$
|h(x)-L|\leq \varepsilon\quad\mbox{se} \quad 0<|x-a|\leq\delta_2.
$$
Assuma que $\delta=\min\{\delta_1,\delta_2\}$. Seja $x\in X$ tal que $0<|x-a|\leq \delta$. Tem-se que
$$
L-\varepsilon\leq f(x)\leq g(x)\leq h(x)\leq L+\varepsilon.
$$
Isto implica que se $0<|x-a|\leq \delta$, então $|g(x)-L|\leq\varepsilon$. Existe então $\lim_{x\rightarrow a}f(x)$ e é igual a $L$. $\Box$

Lema. Sejam $f,g:X\rightarrow\R$ e $a\in X’$ tais que existem $L=\lim_{x\rightarrow a}f(x)$ e $M=\lim_{x\rightarrow a}g(x)$ com $L<M$. Então existe $\delta>0$ tal que $f(x)< g(x)$ para todo $x\in X\cap(a-\delta,a+\delta)\setminus\{a\}$.

Demonstração. Seja $\varepsilon=(M-L)/3$. Existem $\delta_1$ e $\delta_2$ tais que
$$
|f(x)-L|\leq \varepsilon\quad\mbox{se} \quad 0<|x-a|\leq\delta_1
$$
e
$$
|g(x)-M|\leq \varepsilon\quad\mbox{se} \quad 0<|x-a|\leq\delta_2.
$$
Isto implica que
$$
f(x)\leq L+\varepsilon<M-\varepsilon\leq g(x)
$$
se $0<|x-a|\leq \delta$ onde $\delta=\{\delta_1,\delta_2\}$. $\Box$

Corolário. Seja $f:X\rightarrow\R$ e $a\in X’$. Se existir $\lim_{x\rightarrow a}f(x)$ e este limite é positivo, então existe $\delta>0$ tal que $f(x)> 0$ para todo $x\in X\cap(a-\delta,a+\delta)\setminus\{a\}$.

Corolário. Sejam $X\subseteq\R$, $a\in X’$, e $f,g:X\rightarrow\R$ tais que $f(x)\leq g(x)$ para todo $x\in X$ e existem $M=\lim_{x\rightarrow a}f(x)$ e $L=\lim_{x\rightarrow a}g(x)$. Tem-se que $M\leq L$.

Teorema. Sejam $X\subseteq\R$, $a\in X’$  e $f:X\rightarrow\R$ uma função. As seguintes são equivalentes.

  1. existe $L=\lim_{x\rightarrow a} f(x)$;
  2. se $(x_n)$ é uma sequência tal que $x_n\in X\setminus\{a\}$ e $x_n\rightarrow a$ então $f(x_n)\rightarrow L$.

Demonstração. 1.$\Rightarrow$ 2. Seja $(x_n)$ uma sequência tal que $x_n\in X\setminus\{a\}$ e $x_n\rightarrow a$. Seja $\varepsilon>0$. Existe $\delta>0$ tal que $|f(x)-L|\leq\varepsilon$ para todo $x\in X$ tal que $0<|x-a|\leq\delta$. Como $x_n\rightarrow a$, existe $N\in\N^+$ tal que $|x_n-a|\leq \delta$ se $n\geq N$. Obtem-se que se $n\geq N$, então $|x_n-a|\leq \delta$, e assim $|f(x_n)-L|\leq\varepsilon$. Portanto $f(x_n)\rightarrow L$.

2.$\Rightarrow$ 1. Assuma que a afirmação 1. é falsa. Existe $\varepsilon>0$ tal que para todo $\delta>0$ existe $x\in X$ com $0<|x-a|\leq \delta$ mas $|f(x)-L|>\varepsilon$. Seja $n\in\N^+$. Existe então $x_n\in X$ tal que $0<|x_n-a|\leq 1/n$, mas $|f(x_n)-L|>\varepsilon$. A sequência $(x_n)$ converge a $a$, mas $f(x_n)$ não converge a $L$.  $\Box$

Corolário. Sejam $X\subseteq\R$, $a\in X’$  e $f:X\rightarrow\R$ uma função. As seguintes são equivalentes.

  1. existe $\lim_{x\rightarrow a}f(x)$;
  2. se $(x_n)$ é uma sequência tal que $x_n\in X\setminus\{a\}$ e $x_n\rightarrow a$, então $f(x_n)$ é convergente.

Demonstração. Pelo teorema anterior, tem-se que a afirmação 1. implica a afirmação 2.

Assuma afirmação 2. Afirmamos que existe $L$ tal que se $(x_n)$ é uma sequência como na afirmação 2., então $f(x_n)\rightarrow L$ (ou seja, o limite de $(f(x_n))$ não depende da sequência $(x_n)$). De fato, se existessem $(x_n)$ e $(y_n)$ tais que $x_n,y_n\in X\setminus\{a\}$, $x_n\rightarrow a$, $y_n\rightarrow a$, mas $f(x_n)\rightarrow L$ e $f(y_n)\rightarrow M$ com $L\neq M$, então tomando $(z_n)=(x_1,y_2,x_2,y_2,\ldots)$. teríamos que $z_n\rightarrow a$, mas $f(z_n)$ é divergente. Portanto, a afirmação verdadeira. Neste caso o teorema anterior implica que $\lim_{x\rightarrow a}=L$. $\Box$

Teorema. Sejam $f,g:X\subseteq\R\rightarrow\R$ funções, $a\in X’$. Assuma que existem $M=\lim_{x\rightarrow a}f(x)$ e $L=\lim_{x\rightarrow a}g(x)$. As seguintes afirmações são válidas.

  1. $\lim_{x\rightarrow a}(f(x)+g(x))=L+M$;
  2. $\lim_{x\rightarrow a}(f(x)\cdot g(x))=LM$;
  3. $\lim_{x\rightarrow a}(\alpha f(x))=\alpha L$ para todo $\alpha\in\R$;
  4. se $M\neq 0$ e $g(x)\neq 0$ para $x\in X$, então $\lim_{x\rightarrow a}f(x)/g(x)=L/M$;
  5. se $L=0$ e $g(x)$ é uma função limitada em $X$, então $\lim_{x\rightarrow a}(f(x)\cdot g(x))=0$.

Demonstração. Demonstraremos por exemplo a afirmação 2. O resto é exercício. Seja $(x_n)$ uma sequência com $x_n\in X\setminus\{a\}$ e $x_n\rightarrow a$. Então $f(x_n)+g(x_n)\rightarrow L+M$. Usando o teorema anterior, $\lim_{x\rightarrow a}(f(x)\cdot g(x))=LM$. $\Box$

Teorema. Sejam $X,Y\subseteq\R$, $f:X\rightarrow Y$, $g:Y\rightarrow\R$ funções, $a\in X’$, $b\in Y\cap Y’$ e assuma que $\lim_{x\rightarrow a}f(x)=b$ e $\lim_{y\rightarrow b}g(y)=g(b)$. Então $\lim_{x\rightarrow a}f(g(x))=g(b)$.

Demonstração. Seja $\varepsilon>0$. Existe $\gamma>0$ tal que se $y\in Y$ com $|y-b|\leq\gamma$, então $|g(y)-g(b)|\leq\varepsilon$. Existe $\delta>0$ tal que se $0<|x-a|<\delta$, então $|f(x)-b|\leq\gamma$. Então se $x\in X$ tal que $0<|x-a|\leq \delta$, então $|f(x)-b|\leq \gamma$, e $|g(f(x))-g(b)|\leq\varepsilon$. $\Box$

Limites laterais

Seja $X\subseteq\R$ e $a\in\R$. O ponto $a$ é dito ponto de acumulação à direita de $X$ se $X\cap (a,a+\varepsilon)\neq\emptyset$ for all $\varepsilon>0$. O conjunto de pontos de acumulação à direita de $X$ é denotado por $X’_+$.

Sejam $f:X\rightarrow \R$, $a\in X’_+$, e $L\in\R$. Diz se que o limite lateral à direita da função $f$ no ponto $a$ é $L$ se para todo $\varepsilon>0$ existe $\delta>0$ tal que $|f(x)-L|\leq \varepsilon$ sempre que $x\in X\cap (a,a+\delta)$. Escrevemos
$$
\lim_{x\rightarrow a+}f(x)=L.
$$

Define-se de modo análogo os conceitos de ponto de acumulação à esquerda e limite lateral à esquerda.

Lema. Seja $f:X\rightarrow \R$ uma função e seja $a\in X’_+\cap X’_-$. Então existe $\lim_{x\rightarrow a}f(x)$ se e somente se existem $\lim_{x\rightarrow a+}f(x)$ e $\lim_{x\rightarrow a-}f(x)$ e eles são iguais.

Demonstração. Pelas definições, se existe o limite, existem os limites laterais e são iguais. Assuma que existem os limites laterais e eles são iguais a $L$. Seja $\varepsilon>0$. Então existem $\delta_1,\ \delta_2>0$ tal que se
$x\in X\cap (a,a+\delta_1)$, então $|f(x)-L|\leq\varepsilon$ e se $x\in X\cap (a-\delta_2,a)$, então $|f(x)-L|\leq\varepsilon$. Seja $\delta=\min\{\delta_1,\delta_2\}$. Se $x\in X\cap(a-\delta,a+\delta)\setminus\{a\}$, então $|f(x)-L|\leq\varepsilon$. $\Box$

Teorema. Seja $f:X\subseteq\R\rightarrow\R$ uma função monótona e limitada. Se $a\in X_+$, então existe o limite lateral $\lim_{x\rightarrow a+}f(x)$.

Demonstração. Assuma sem perder generalidade que $f(x)$ é não decrescente. Afirmamos que
$$
\lim_{x\rightarrow a+}f(x)=\inf\{f(x)\mid x\in X,\ a<x\}.
$$
Denote o lado direito da última igualdade por $L$. Seja $\varepsilon>0$. Então $L+\varepsilon$ não é cota inferior de $\{f(x)\mid x\in X,\ a<x\}$. Então existe $\delta>0$ tal que $a+\delta\in X$ e
$$
L\leq f(a+\delta)<L+\varepsilon.
$$
Portanto, se $x\in X\cap (a,a+\delta)$ então
$$
L-\varepsilon<L\leq f(x)\leq f(a+\delta)<L+\varepsilon;
$$
ou seja $|f(x)-L|\leq\varepsilon$. $\Box$

Topologia da Reta: Pontos de acumulação e conjuntos compactos

$\newcommand{\N}{\mathbb N}\newcommand{\R}{\mathbb R}\newcommand{\Z}{\mathbb Z}\newcommand{\A}{\mathcal A}$Seja $X\subseteq\R$ um conjunto e $a\in\R$. O ponto $a$ chama-se ponto de acumulação de $X$, se, para todo $\varepsilon > 0$, tem-se que  $X\cap ((a-\varepsilon,a+\varepsilon)\setminus\{a\})\neq\emptyset$. O conjunto de pontos de acumulação de $X$ é denotado por $X’$. É claro que se $a\in X’$, então $a$ é um ponto aderente a $X$, mas não é verdade que todo ponto aderente é um ponto de acumulação.

Lema. Seja $X\subseteq\R$ e $a\in\R$. As seguintes são equivalentes.

  1. $a\in X’$.
  2. $a=\lim x_n$ para uma sequência $(x_n)$ com termos $x_n\in X$ dois a dois distintos.
  3. Todo intervalo aberto que contém $a$ possui infinitos elementos de $X$.

Em particular, se $X’\neq\emptyset$, então $X$ é infinito.

Demonstração. Assuma 1. Seja $\varepsilon_1=1$ e seja $x_1\in X\cap ((a-\varepsilon_1,a+\varepsilon_1)\setminus\{a\})$. Construímos recursivamente uma sequência $(x_n)$ tal que

  1. $x_n\in X$, os termos $x_n$ são distintos dois a dois;
  2. $|a-x_n|\leq 1/n$ para todo $n$.

O termo $x_1$ foi escolhido acima. Assuma que os termos $x_1,\ldots,x_{n-1}$ foram escolhidos. Seja $0<\varepsilon_n\leq 1/n$ tal que $(a-\varepsilon_n,a+\varepsilon_n)$ não contém nenhum termo $x_1,\ldots,x_{n-1}$. Então $X\cap((a-\varepsilon_n,a+\varepsilon_n)\setminus\{a\})\neq\emptyset$. Seja $x_n$ um elemento de $X\cap((a-\varepsilon_n,a+\varepsilon_n)\setminus\{a\})$. Então $x_n\in X$, $|a-x_n|\leq 1/n$ e $x_n$ é distinto de $x_1,\ldots,x_{n-1}$. Como $|x_n-a|\leq 1/n$, $x_n\rightarrow a$ e afirmação 2. é provada.

Assuma 2. Seja $I$ um intervalo aberto que contém $a$. Então $a$ é ponto interior de $I$ e existe $\varepsilon > 0$ tal que $a\in(a-\varepsilon,a+\varepsilon)\subseteq I$. Seja $(x_n)$ uma sequência com termos em $X$ dois a dois distintos e com $\lim x_n=a$. Existe $N\in\N^+$ tal que $x_n\in (a-\varepsilon,a+\varepsilon)$ para todo $n\geq N$. Isto implica que $x_n\in I$ para todo $n\geq N$. Consequentemente, o conjunto $\{x_n,x_{n+1},\ldots\}$ é infinito e é contido em $X\cap I$. Assim, obtem-se que afirmação 3. é verdadeira.

O fato que afirmarmação 3. implica afirmação 1. é imediato da definição de ponto de acumulação. $\Box$

Lema. Se $X\subseteq\R$, então $\overline X=X\cup X’$.

Demonstração. Exercício. $\Box$

Seja $X$ um conjunto. Se $\mathcal A=\{A_i\mid i\in I\}$ é uma família de conjuntos ($I$ sendo um conjunto de índices) tal que $X\subseteq \bigcup_{i\in I} A_i$, então $\mathcal A$ é dito uma cobertura de $X$. Uma cobertura $\mathcal A$ é chamada de cobertura aberta se os conjuntos de $\A$ são abertos. Uma cobertura $\mathcal B$ é dita subcobertura de $\A$ se $\mathcal B\subseteq \A$.

Um conjunto $X\subseteq\R$ é dito compacto, se toda cobertura aberta de $X$ possui uma subcobertura finita.

Exemplo. A família $\{(a+1/n,b-1/n)\mid n\in\N^+\}$ é uma cobertura aberta do intervalo $(a,b)$  mas não possui subcobertura finita. Portanto $(a,b)$ não é compacto.

Exemplo. Seja $X\subseteq\R$ um conjunto illimitado. A família $\{(n,n+2)\mid n\in\Z\}$ é uma cobertura aberta de $X$ que não possui uma subcobertura finita. Portanto $X$ não é compacto.

Exemplo. Se $X\subseteq\R$ é finito então $X$ é compacto.

Exemplo. Seja $X=[a,b]$ um intervalo fechado e limitado. Afirmamos que $X$ é compacto. Seja $\{A_i\mid i\in I\}$ uma cobertura aberta de $X$. Seja
$$
Y=\{x\in X\mid [a,x]\mbox{ pode ser coberto por um número finito dos $A_i$}\}.
$$
Como $a\in Y$, tem-se que $Y\neq\emptyset$. Como $Y$ é limitado superiormente, existe $c=\sup Y$. Claramente, $a<c\leq b$. Afirmamos que $c\in Y$. Como $c\in X$, existe $A\in\mathcal A$ tal que $c\in A$. Além disso, $A\in\mathcal A$ é aberto, então $c$ é ponto interior de $A$ e existe $\varepsilon>0$ tal que $c-\varepsilon>a$ e o  intervalo $I=(c-\varepsilon,c+\varepsilon)$ satisfaz $c\in I\subseteq A$. Seja $x=a-\varepsilon/2$. Temos que $x\in Y$ então existe uma cobertura  $\{A_{i_1},\ldots,A_{i_k}\}$ de $[a,x]$. Neste caso   $\{A_{i_1},\ldots,A_{i_k},A\}$ é uma cobertura de $[a,c]$. Portanto $c\in Y$.

Afirmamos agora que $c=b$. Assuma que não. Seja $\{A_{i_1},\ldots,A_{i_k}\}$ uma cobertura de $[a,c]$. Assuma sem perder generalidade que $c\in A_{i_k}$. Então $c$  é ponto interior a $A_{i_k}$ que implica que existe um $\varepsilon>0$ tal que $c+\varepsilon\leq b$ e $(c-\varepsilon,c+\varepsilon)\subseteq A_{i_k}$. Isto implica que a cobertura $\{A_{i_1},\ldots,A_{i_k}\}$ é uma cobertura de $[a,c+\varepsilon/2]$ e $c+\varepsilon/2\in Y$ que contradiz ao fato que $c=\sup Y$.

Os dois exemplos mostram os dois principais impedimentos para um conjunto ser compacto. De fato provaremos que um conjunto é compacto se e somente se ele é fechado e limitado.

Teorema. As seguintes afirmações são equivalentes para um conjunto $X\subseteq \R$.

  1. $X$ é fechado e limitado.
  2. $X$ é compacto.
  3. Todo subconjunto infinito de $X$ possui um ponto de acumulação pertencente a $X$.
  4. Toda sequência $(x_n)$ tal que $x_n\in X$ possui uma subsequência $(x_{k_n})$ convergente tal que $\lim x_{k_n}\in X$.

Demonstração. 1.$\Rightarrow$ 2. Seja $X$ fechado e limitado. Portanto $A=\R\setminus X$ é aberto. Como $X$ é limitado, $X\subseteq [a,b]$ com algum intervalo fechado $[a,b]$. Assuma que $\{A_i\mid i\in I\}$ é uma cobertura aberta de $X$. Então $\{A_i\mid i\in I\}\cup\{A\}$ é uma cobertura de $[a,b]$. Pelo exemplo acima, $[a,b]$ possui uma subcobertura $\{A_{i_1},\ldots,A_{i_k}\}$ que também será uma cobertura que $X$.

2.$\Rightarrow$ 3. Seja $X$ um conjunto compacto e seja $Y$ um subconjunto que não possui ponto de acumulação em $X$. Se $x\in X$, então $x$ não é ponto de acumulação de $Y$. Portanto, existe $\varepsilon_x>0$ tal que $((x-\varepsilon_x,x+\varepsilon_x)\setminus\{x\})\cap Y=\emptyset$. Seja $I_x=(x-\varepsilon_x,x+\varepsilon_x)$. A família $\{I_x\mid x\in X\}$ é uma cobertura aberta de $X$. Como $X$ é compacto, existem $x_1,\ldots,x_k\in X$ tal que $\{I_{x_1},\ldots,I_{x_k}\}$ é uma cobertura finita de $X$. No entanto $I_{x_i}\cap Y\subseteq\{x_i\}$ vale para todo $x_i$. Isto implica que $Y\subseteq\{x_1,\ldots,x_k\}$ e que $Y$ é finito.

3.$\Rightarrow$ 4. É óbvio pelo lema acima.

4.$\Rightarrow$ 1. Assuma que  $X$ não é limitado superiormente. Então para todo $n\in \N^+$ existe $x_n\in X$ tal que $x_n\geq n$. Neste caso, $x_n\rightarrow\infty$, and so $x_n$ não possui uma subsequência convergente com limite em $X$. Logo se $X$ não é limitado, então afirmação 4. não vale para $X$.

Assuma agora que $X$ não é fechado. Neste caso existe $a\in \R\setminus X$ tal que $a$ é ponto aderente a $X$. Existe uma sequência $(x_n)$ convergente tal que $x_n\in X$ e $\lim x_n=a$. Todas as subsequências $(x_{k_n})$ de $(x_n)$ são convergentes com $\lim x_{k_n}=a$. Portanto, se $X$ não é fechado, então afirmação 4. não vale para $X$. $\Box$

Topologia da reta: Conjuntos abertos e fechados

$\newcommand{\R}{\mathbb R}\newcommand{\N}{\mathbb N}$Seja $X\subseteq\R$. Um ponto $x\in X$ é dito ponto interior de $X$ se existir um intervalo aberto $(a,b)$ tal que $x\in(a,b)\subseteq X$. Um conjunto $X\subseteq\R$ é dito aberto se todos os seus pontos são interiores.

Lemma. As seguintes afirmações são válidas.

  1. $\emptyset$ e $\R$ são abertos.
  2. Se $X$ e $Y$ são abertos então $X\cap Y$ é aberto.
  3. Se $I$ é um conjunto de índices e $X_i$ é um conjunto aberto para todo $i\in I$, então $\bigcup_{i\in I}X_i$ é aberto.

Demonstração. 

  1. É claro.
  2. Seja $x\in X\cap Y$. Como $X$ e $Y$ são abertos, existem intervalos abertos $(a_1,b_1)$ e $(a_2,b_2)$ tal que $x\in  (a_1,b_1)$, $x\in(a_2,b_2)$, $(a_1,b_1)\subseteq X$, $(a_2,b_2)\subseteq Y$. Seja $a=\max\{a_1,a_2\}$ e $b=\min\{b_1,b_2\}$. Então $x\in(a,b)$ e $(a,b)\subseteq X\cap Y$. Então $x$ é ponto interior de $X\cap Y$.
  3. Seja $x\in\bigcup_{i\in I}X_i$. Então existe $i\in I$ tal que $x\in X_i$. Como $X_i$ é aberto, existe um intervalo $(a,b)$ tal que $x\in(a,b)\subseteq X_i$. Portanto $x\in(a,b)\subseteq\bigcup_i X_i$ e $x$ é ponto interior de $\bigcup_i X_i$. $\Box$

Teorema. Um conjunto $X$ é aberto se e somente se ele é uma união de intervalos abertos dois a dois disjuntos. A decomposição de um conjunto aberto para união de intervalos abertos dois a dois disjuntos é única.

Demonstração. A direção $\Leftarrow$ segue do lema anterior. A outra direção e a unicidade não serão demonstradas; veja no livro do Elon.$\Box$

Um conjunto $X\subseteq \R$ é dito fechado se $\R\setminus X$ é aberto.

Lemma.

  1. $\emptyset$ e $\R$ são fechados.
  2. Se $X$ e $Y$ são fechados, então $X\cup Y$ é fechado.
  3. Se $I$ é um conjunto de índices e $X_i$ é um conjunto fechado para todo $i\in I$, então $\bigcap_{i\in I}X_i$ é fechado.

Demonstração. Segue do lema anterior.$\Box$

Seja $X\subseteq \R$. Um ponto $a\in\R$ é dito aderente a $X$ se existe uma sequência $(x_n)$ com $x_n\in X$ e $\lim x_n=a$.

Lema. Seja $X\subseteq\R$ e $a\in \R$. As seguintes são equivalentes.

  1. $a$ é aderente a $X$;
  2. para todo $\varepsilon>0$, $(a-\varepsilon,a+\varepsilon)\cap X\neq \emptyset$.

Demonstração. Assuma que $a$ é aderente a $X$ e seja $(x_n)$ é uma sequência com $x_n\in X$ e $x_n\rightarrow a$. Seja $\varepsilon>0$. Como $x_n\rightarrow a$, existe $N\in\N^+$ tal que $x_n\in [a-\varepsilon/2,a+\varepsilon/2]\subseteq (a-\varepsilon,a+\varepsilon)$ para todo $n\geq N$. Portanto, $X\cap (a-\varepsilon,a+\varepsilon)\neq\emptyset$.

Assuma agora que afirmação 2. é verdadeira. Para todo $n\in\N^+$ escolha um elemento $x_n\in X$ tal que $x_n\in (a-1/n,a+1/n)\cap X$. Então $x_n$ é uma sequência de termos em $X$ e $x_n\rightarrow a$.$\Box$

Corolário. Se $X\subseteq\R$ é um conjunto limitado interiormente [superiormente], então $\inf X$ [$\sup X]$ é  aderente a $X$.

Demonstração. Seja $a=\inf X$ e $\varepsilon>0$. Então $a+\varepsilon$ não é cota inferior de $X$, portanto existe $x\in X$ tal que
$$
a-\varepsilon<a\leq x<a+\varepsilon.
$$
Logo, $x\in X\cap(a-\varepsilon,a+\varepsilon)$. Como $\varepsilon$ é arbitrário, obtemos que a afirmação 2. do lema anterior é válida. Portanto $a=\inf X$ é aderente a $X$.$\Box$

Teorema. Seja $X\subseteq\R$ e $a\in \R$. As seguintes são equivalentes.

  1. $X$ é fechado;
  2. se $a\in\R$ é aderente a $X$, então $a\in X$.

Demonstração. Assuma que $X$ é fechado; ou seja, $\R\setminus X$ é aberto. Seja $a\in \R\setminus X$. Então $a$ é um ponto interior de $\R\setminus X$. Existe $\varepsilon>0$ tal que $a\in (a-\varepsilon,a+\varepsilon)\subseteq \R\setminus X$. Então se $x\in X$, temos que $|x-a|\geq \varepsilon$ e isto implica que não pode existir uma sequência $(x_n)$ com $x_n\in X$ e $x_n\rightarrow a$. Obtivemos que $a$ não é aderente a $X$ e que afirmação 1. implica afirmação 2.

Assuma agora que todo ponto aderente a $X$ pertence a $X$. Seja $a\in \R\setminus X$. Então $a$ não é aderente a $X$. Pelo lema acima, existe $\varepsilon>0$ tal que $(a-\varepsilon,a+\varepsilon)\cap X=\emptyset$; ou seja $(a-\varepsilon,a+a+\varepsilon)\subseteq \R\setminus X$. Isto significa que $a$ é um ponto interior a $\R\setminus X$. Como $a\in\R\setminus X$ foi escolhido arbitrariamente, temos que $\R\setminus X$ é aberto; ou seja, $X$ é fechado.$\Box$

Se $X\subseteq\R$ então definimos o fecho $\overline X$ de $X$ como
$$
\overline X=\{a\in \R\mid \mbox{$a$ é aderente a $X$}\}.
$$
Segue-se que $X\subseteq \overline X$.

Corolário. $X\subseteq\R$ é fechado se e somente se $\overline X=X$. O fecho de um conjunto é fechado.

Demonstração. A primeira afirmação é consequência imediata do lema anterior.  Seja $a\in\R\setminus \overline X$. Então $a$ não é ponto aderente a $X$ e existe $\varepsilon>0$ tal que $(a-\varepsilon,a+\varepsilon)\cap X=\emptyset$. Portanto $(a-\varepsilon,a+\varepsilon)\subseteq R\setminus X$. Além disso, se $x\in(a-\varepsilon,a+\varepsilon)$, então $x\not\in \overline X$. Logo $(a-\varepsilon,a+\varepsilon)\subseteq \R\setminus\overline X$ e segue que $a$ é um ponto interior de $\R\setminus \overline X$. Portanto $\R\setminus \overline X$ é aberto que implica que $\setminus X$ é fechado. $\Box$

 

 

Exercícios (Séries)

$\newcommand{\N}{\mathbb N}$ $\newcommand{\Z}{\mathbb Z}$ $\newcommand{\Q}{\mathbb Q}$ $\newcommand{\R}{\mathbb R}$

1. Sejam $\sum a_n$ e $\sum b_n$ séries convergentes tais que $\sum a_n=a$ e $\sum b_n=b$. Demonstre as seguintes:

  1. $\sum(a_n + b_n)=a+b$;
  2. $\sum(\alpha a_n)=\alpha a$;
  3. $\sum (a_nb_n)$ não é necessariamente igual a $ab$.

2. Define para $x\in\R$ as seguintes funções.

  1. $e(x)=\sum_{n\geq 0}x^n/n!$;
  2. $s(x)=\sum_{n\geq 0}(-1)^n x^{2n+1}/(2n+1)!$;
  3. $c(x)=\sum_{n\geq 0}(-1)^n x^{2n}/(2n)!$;
  4. $sh(x)=\sum_{n\geq 0}x^{2n+1}/(2n+1)!$;
  5. $ch(x)=\sum_{n\geq 0}x^{2n}/(2n)!$.

Demonstre que essas funções são bem definidas no sentido que as séries são convergentes para todo $x\in\R$. Demonstre que as séries são absolutamente convergentes.

3. Decide quais das seguintes séries são absolutamente convergentes, condicionalmente convergentes, ou divergentes.

  1. $\sum_{n\geq 1} 1/n$;
  2. $\sum_{n\geq 1} 1/n^2$;
  3. $\sum_{n\geq 4} 1/(n-3)$;
  4. $\sum_{n\geq 1} 1/(n^2+2)$;
  5. $\sum_{n\geq 1} 1/3^n$;
  6. $\sum_{n\geq 1} 1/(3^n+1)$;
  7. $\sum_{n\geq 1} 1/\ln n$;
  8. $\sum_{n\geq 1} n^2/(n^4+2)$;
  9. $\sum_{n\geq 1} n\cdot\mbox{sen}^2\,n/(n^3+1)$;
  10. $\sum_{n\geq 1} 1/(n!)$;
  11. $\sum_{n\geq 1} 1/((2n)!)$;
  12. $\sum_{n\geq 1} n!/((2n)!)$;
  13. $\sum_{n\geq 1} (2n)!/(n!(n+1)!)$;
  14. $\sum_{n\geq 1} 1/(r^n n!)$ com $r>1$;
  15. $\sum_{n\geq 1} (-1)^n/(2^n)$;
  16. $\sum_{n\geq 1} (-1)^n/(2n)$;
  17. $\sum_{n\geq 1} (-1)^n(1+1/n^2)$;
  18. $\sum_{n\geq 1} (-1)^n/(n^4+7)$.

4. Seja $\sum_{n\geq 0}a_n$ uma série condicionalmente convergente e defina $$ p_n=\left\{\begin{array}{ll} a_n & \mbox{se $a_n\geq 0$}\\ 0 & \mbox{se $a_n<0$}\end{array}\right. $$ e $$ q_n=\left\{\begin{array}{ll} -a_n & \mbox{se $a_n< 0$}\\ 0 & \mbox{se $a_n\geq 0$}\end{array}\right. $$ Demonstre que as séries $\sum p_n$ e $\sum q_n$ são divergentes.

5. Seja $\sum_{n\geq 0}a_n$ uma série condicionalmente convergente e seja $c\in\{\infty,-\infty\}$. Esboçe uma reordenação $\sum a_{\varphi(n)}$ da série $\sum a_n$ tal que $\sum a_{\varphi(n)}=c$.

Comutatividade e produto de séries

$\newcommand{\N}{\mathbb N}\newcommand{\R}{\mathbb R}$Seja $\sum a_n$ uma série. Se $\pi:\N\rightarrow\N$ é uma bijeção e $b_n=a_{\pi(n)}$ para todo $n\in\N$, então $\sum b_n$ é uma outra série.A série $\sum b_n$ é chamada de uma reordenação de $\sum a_n$ Pode-se perguntar se $\sum b_n$ é convergente ou divergente.

Uma série $\sum a_n$ chama-se comutativamente convergente se, para toda bijeção $\pi:\N\rightarrow\N$, a série $\sum a_{\pi(n)}$ é convergente e o limite $\sum a_{\pi(n)}$ é igual ao limite de $\sum a_n$.

Seja $\sum a_n$ uma série. Defina
$$
p_n=\left\{\begin{array}{ll} a_n & \mbox{se $a_n\geq 0$};\\
0 & \mbox{no caso contrário.}\end{array}\right.$$
Similarmente, seja
$$
q_n=\left\{\begin{array}{ll} -a_n & \mbox{se $a_n<0$};\\
0 & \mbox{no caso contrário.}\end{array}\right.
$$
Tem-se que $a_n=p_n-q_n$ e $|a_n|=p_n+q_n$ e pode-se considerar $\sum p_n$ e $\sum q_n$ como séries. Estas séries são chamadas da parte positiva e da parte negativa de $\sum a_n$.

Lemma. Seja $\sum a_n$ uma série convergente. Então $\sum a_n$ é absolutamente convergente se e somente se $\sum p_n$ e $\sum q_n$ são convergentes.  Neste caso $\sum p_n-\sum q_n=\sum a_n$.

Demonstração. Assuma que $\sum a_n$ é absolutamente convergente. Então a sequência $s_n=|a_0|+\cdots+|a_n|$ é limitada. Por outro lado
$$
\sum_{i=0}^n (p_i+q_i)=\sum_{i=0}^n |a_i|.
$$
Portanto a sequência $(\sum_{i=0}^n (p_i+q_i))_n$ é limitada. Isto implica que as sequências $\left(\sum_{i=0}^n p_i\right)_n$ e $\left(\sum_{i=0}^n q_i\right)_n$ são também limitadas, e as séries $\sum p_n$ e $\sum q_n$ são convergentes.

Deixamos ao leitor verificar que se $\sum a_n$ é condicionalmente convergente então ambas $\sum p_n$ e $\sum q_n$ são divergentes.

Finalmente, verifiquemos que $\sum a_n=\sum p_n-\sum q_n$ quando $\sum a_n$ é absolutamente convergente. Note que
\begin{eqnarray*}
\sum p_n-\sum q_n&=&\lim \sum_{i=0}^n p_i-\lim \sum_{i=0}^n q_i\\&=&\lim \left(\sum_{i=0}^n p_i-\sum_{i=0}^n q_i\right)\\&=&\lim\sum_{i=0}^n(p_i-q_i)=\lim \sum_{i=0}^n a_i=\sum a_n.
\end{eqnarray*}
$\Box$

Teorema.  Se $\sum a_n$ é absolutamente convergente, então $\sum a_n$ é comutativamente convergente.

Demonstração. Assuma que $\sum a_n$ é absolutamente convergente. Considere primeiro o caso quando $a_n\geq 0$. Seja $\pi:\N\rightarrow\N$ uma bijeção e seja $b_n=a_{\pi(n)}$. Afirmamos que $\sum a_n=\sum b_n$. Defina $s_n=a_0+\cdots+a_n$ e $t_n=b_0+\cdots +b_n$. Seja $n\geq 1$ e seja $m$ o maior entre $\pi(1),\ldots,\pi(n)$. Logo $\{\pi(1),\ldots,\pi(n)\}\subseteq \{1,\ldots,m\}$. Portanto
$$
t_n=\sum_{i=0}^n b_i=\sum_{i=0}^n a_{\pi(i)}\leq \sum_{i=0}^m a_i\leq s_m.
$$
Este argumento mostra que para todo $n\in\N$ existe $m\in \N$ tal que $t_n\leq s_m$. Como $s_n$ é uma sequência limitada, $t_n$ também é limitada, portanto $t_n$ é convergente. Isto implica que $\sum b_n$ é convergente e que $\sum b_n\leq \sum a_n$.

Note que o mesmo argumento implica que para todo $n\in\N$ existe um $r\in\N$ tal que $s_n\leq t_r$. Logo $\sum a_n\leq \sum b_n$ e $\sum a_n=\sum b_n$.

Considere agora uma série geral $\sum a_n$ e assuma que ela é absolutamente convergente. Sejam $\sum p_n$ e $\sum q_n$ a parte positiva e a parte negativa. Temos pela discussão acima que $\sum p_n$ e $\sum q_n$ são séries convergentes e $\sum a_n=\sum p_n-\sum q_n$. Uma reordenação $\sum a_{\pi(n)}$ de $\sum a_n$ induz as reordenações $\sum p_{\pi(n)}$ de $\sum p_n$ e  $\sum q_{\pi(n)}$ de $\sum q_n$. Pelo parágrafo anterior
$$
\sum a_{\pi(n)}=\sum p_{\pi(n)}-\sum q_{\pi(n)}=\sum p_n-\sum q_n=\sum a_n.
$$
$\Box$

A recíproca deste teorema está também válida.

Teorema (Riemann). Seja $\sum a_n$ uma série condicionalmente convergente e seja $c\in\R\cup\{\infty,-\infty\}$. Então existe uma reordenação $\sum a_{\pi(n)}$ tal que $\sum a_{\pi(n)}=c$.

Demonstração. Veja no livro de Elon.

Dadas duas séries $\sum_{n\geq 0} a_n$ e $\sum_{n\geq 0} b_n$ definimos o produto $(\sum a_n)(\sum b_n)$ como a série $\sum c_n$ cujos termos são
$$
c_n=a_0b_n+a_1b_{n-1}+\cdots+a_{n-1}b_1+a_nb_0=\sum_{i=0}^na_ib_{n-i}.
$$

Exercício. Sejam $x,\ y\in\R$ e considere as séries $\sum_{n\geq 0} x^n/n!$ e $\sum_{n\geq 0} y^n/n!$. Então
$$
\left(\sum_{n\geq 0}\frac {x^n}{n!}\right)\left(\sum_{n\geq 0}\frac {y^n}{n!}\right)=\sum_{n\geq 0}\frac{(x+y)^n}{n!}.
$$

Teorema. Sejam $\sum a_n$ e $\sum b_n$ duas séries absolutamente convergentes e assuma que $\sum a_n=a$ e $\sum b_n=b$. Então $\left(\sum a_n\right)\left(\sum b_n\right)$ é absolutamente convergente e
$$
\left(\sum a_n\right)\left(\sum b_n\right)=ab.
$$

Demonstração. Seja
$$
x_n=\sum_{i=0}^n(a_ib_n)+\sum_{j=0}^{n-1} (a_nb_j).
$$
Note que
$$
\sum_{i=0}^n x_i=\left(\sum_{i=0}^n a_i\right)\left(\sum_{j=0}^n b_j\right).
$$
Portanto,
$$
\lim_{n\rightarrow\infty} \sum_{i=0}^n x_i= \left(\lim_{n\rightarrow\infty}\sum_{i=0}^n a_i\right)\left(\lim_{n\rightarrow\infty}\sum_{j=0}^n b_j\right)=ab.
$$
Logo $\sum x_n=ab$.

Afirmamos que a série $\sum x_n$ é absolutamente convergente. De fato,
$$
\sum_{i=0}^n |x_i|\leq \left(\sum_{i=0}^n |a_i|\right)\left(\sum_{j=0}^n |b_j|\right).
$$
Como $\sum a_n$ e $\sum b_n$ são absolutamente convergentes, as sequências $\sum_{i\leq n}|a_i|$ e $\sum_{j\leq n}|b_j|$ são limitadas, e $\sum_{i\leq n} |x_i|$ é também limitada. Portanto $\sum x_n$ é absolutamente convergente.

Seja $c_n$ o termo geral do produto $\left(\sum a_n\right)\left(\sum b_n\right)$ e  observe que a série  $\sum c_n$ pode ser obtida de $\sum x_n$ por uma reordenação dos termos. Como $\sum x_n$ é absolutamente convergente, $\sum c_n$ é absolutamente convergente e $\sum c_n=\sum x_n=ab$.

O estudo de séries trata de somas infinitas. Nós definimos o valor da soma infinita pelo limite das somas parciais, mas esta não é a única definição sensível; veja por exemplo este episódio do canal Mathologer.

 

Testes de convergência para séries

$\newcommand{\N}{\mathbb N}$

Teorema (Teste da raiz). Se existirem $0\leq c<1$ e $n_0\in\N$ tal que $\sqrt[n]{|a_n|}\leq c$ para todo $n\geq n_0$, então a série $\sum a_n$ é absolutamente convergente. Em particular, se $\limsup \sqrt[n]{|a_n|}<1$, então a série é absolutamente convergente.

Demonstração. As condições do teorema implicam que $|a_n|\leq c^n$ para todo $n\geq n_0$. Como $0\leq c<0$, temos que $\sum c^n$ é convergente. Pelo teorema da comparação,  $\sum |a_n|$ é convergente, logo $\sum a_n$ é absolutamente convergente.

Assuma que $a:=\limsup \sqrt[n]{|a_n|}<1$. Seja $\varepsilon=(1-a)/2$. Então $a+\varepsilon<1$. Por um exercício anterior, existe $n_0\in\N$ tal que $\sqrt[n]{|a_n|}\leq a+\varepsilon$. Pelo parágrafo anterior, $\sum a_n$ é absolutamente convergente.$\Box$

Note que as condições do teorema anterior são válidas quando existe $\lim_{n\rightarrow\infty} \sqrt[n]{|a_n|}$ e este limite é menor que um.

Exercício. Demonstre que se existem infinitos índices $n$ tal que $\sqrt[n]{|a_n|}\geq 1$, então a série $\sum a_n$ diverge.

No caso $\lim\sqrt{|a_n|}=1$ não pode-se decidir usando o teste da raiz se a série diverge ou converge. Por exemplo, a série $\sum(1/n)$ diverge, enquanto $\sum(1/n^2)$ converge. Por outro lado,
$$
\lim_{n\rightarrow\infty}\sqrt[n]{(1/n)}=\lim_{n\rightarrow\infty}\sqrt[n]{(1/n^2)}=1.
$$

Teorema (Teste da razão). Assuma que $\sum a_n$ é uma série com $a_n\neq 0$. Assuma que existe um $n_0\in \N$ e $0<c<1$ tal que $|a_{n+1}|/|a_n|\leq c$ para todo $n\geq n_0$. Então a série $\sum a_n$ converge absolutamente. Em particular, se $\limsup |a_{n+1}|/|a_n|<1$, então a série $\sum a_n$ é absolutamente convergente.

Demonstração. Se $n\geq n_0$, temos que
$$
\frac{|a_{n_0+1}|}{|a_{n_0}|}\leq c,\ \frac{|a_{n_0+2}|}{|a_{n_0+1}|}\leq c,\ldots,\frac{|a_{n}|}{|a_{n-1}|}\leq c,
\frac{|a_{n+1}|}{|a_{n}|}\leq c.
$$
Multiplicando estas desigualdades, obtemos que
$$
\frac{|a_{n+1}|}{|a_{n_0}|}=\frac{|a_{n_0+1}|}{|a_{n_0}|}\frac{|a_{n_0+2}|}{|a_{n_0+1}|}\cdots \frac{|a_{n}|}{|a_{n-1}|} \frac{|a_{n+1}|}{|a_{n}|}\leq c^{n-n_0+1}
$$
Portanto,
$$
|a_{n+1}|\leq c^{n-n_0+1}|a_{n_0}|=c^{n+1}(|a_{n_0}|/c^{n_0}).
$$
Como $0<c<1$, segue da Teste da Comparação que $\sum a_n$ é absolutamente convergente.

A afirmação sobre o $\limsup$ pode ser verificada como no caso do teste da raiz.

Como no caso do teste da raiz, podemos também afirmar que se $\lim |a_{n+1}|/|a_n|<1$, então a série é convergente. Se $\lim |a_{n+1}|/|a_n|=1$, então a série pode ser convergente ou divergente; considere as séries $\sum (1/n)$ e $\sum (1/n^2)$.

Exercício. Assuma que existem infinitos índices $n$ tal que $|a_{n+1}|/|a_n|\geq 1$. Demonstre que a série $\sum a_n$ é divergente.

Lema. Seja $(a_n)$ uma sequência limitada de números reais positivos. Então
$$
\liminf \frac{a_{n+1}}{a_n}\leq \liminf \sqrt[n]{a_n}\leq \limsup \sqrt[n]{a_n}\leq \limsup \frac{a_{n+1}}{a_n}.
$$

Demonstração. Só precisa-se demonstrar a primeira e a terceira desigualdade. Nós demonstraremos a primeira. A terceira fica como exercício. Assuma por absurdo que $\liminf \frac{a_{n+1}}{a_n}> \liminf \sqrt[n]{a_n}$. Então existe um  número $c$ tal que  $\liminf \sqrt[n]{a_n}<c<\liminf \frac{a_{n+1}}{a_n}$. Isto quer dizer que existe $n_0$ tal que
$c\leq {a_{n+1}}/{a_n}$ para todo $n\geq n_0$. Logo
$$
c\leq \frac{a_{n_0+1}}{a_{n_0}},\ldots, c\leq \frac {a_{n+1}}{a_{n}}.
$$
Multiplicando estas desigualdades, obtemos que $c^{n-n_0+1}\leq a_{n+1}/a_{n_0}$; ou seja
$$
a_{n+1}\geq c^{n-n_0+1}a_{n_0}=(a_{n_0}/c^{n_0})c^{n+1}.
$$
Tomando $(n+1)$-ésima raiz e $\liminf$, obtemos que $\liminf\sqrt[n]{a_n}\geq c$, que é uma contradição.

Teorema (Dirichlet). Seja $\sum a_n$ uma série tal que as reduzidas $s_n=a_1+\cdots+a_n$ formam uma sequência limitada. Seja $(b_n)$ uma sequência não crescente de números positivos com $\lim b_n=0$. Então a série $\sum (a_nb_n)$ é convergente.

Demonstração. Temos que
\begin{eqnarray*}
t_n&=&a_1b_1+\cdots+a_nb_n\\
&=&a_1(b_1-b_2)+(a_1+a_2)(b_2-b_3)\\&+&(a_1+a_2+a_3)(b_3-b_4)+\cdots
+(a_1+\cdots+a_n)b_n\\
&=&s_1(b_1-b_2)+s_2(b_2-b_3)+s_3(b_3-b_4)+\cdots +s_nb_n\\
&=&\sum_{n=2}^n s_{i-1}(b_{i-1}-b_i)+s_nb_n.
\end{eqnarray*}
Note que a série $\sum_{n\geq 2}(b_{i-1}-b_i)$ ´é convergente e a sequência $s_n$ é limitada, Portanto segue da testa da comparação que $\sum_{n=2}^n s_{i-1}(b_{i-1}-b_i)$ é absolutamente convergente. Isto implica que $a_1b_1+\cdots+a_nb_n$ é convergente. Além disso, como $(s_n)$ é limitada e $b_n\rightarrow 0$, tem-se que $\lim s_nb_n=0$ e portanto a série $\sum (a_nb_n)$ é convergente.

O Teorema de Dirichlet implica imediatamente o Teorema de Leibniz e o Teorema de Abel.

Teorema (Leibniz). Se $(b_n)$ é uma sequência não crescente com $\lim b_n=0$, então a série $\sum (-1)^nb_n$ é convergente.

Teorema (Abel). Se $\sum a_n$ é convergente e $(b_n)$ é uma sequência não crescente de números positivos, então $\sum (a_nb_n)$ é convergente.