$\newcommand{\F}{\mathbb F}$Seja $G$ um grupo e $\Omega$ um conjunto. Dizemos que $G$ age em $\Omega$ se está dada uma função
\[
\Omega\times G\to \Omega,\quad (\omega,g)\mapsto \omega g
\]
com as seguintes propriedades:
- $\alpha 1=\alpha$ para todo $\alpha\in\Omega$;
- $\alpha(gh)=(\alpha g)h$ para todo $\alpha\in \Omega$, $g,h\in G$.
Se $\alpha\in\Omega$, o elemento $\alpha g$ é dito imagem de $\alpha$ por $g$.
Exemplos. Nos seguintes exemplos apresentamos ações importantes de grupos. O leitor deve verificar que cada item define uma ação.
- Seja $G\leq\mbox{Sym}(\Omega)$. Neste caso $G$ é dito um grupo de permutação sobre $\Omega$. O grupo $G$ age naturalmente em $\Omega$.
- Seja $G=D_4$ e $\Omega$ o conjunto das quatro pontas no quadrado. O grupo $G$ age em $\Omega$ naturalmente.
- Seja $G\leq GL(n,\F)$ e $\Omega=\F^n$. O grupo $G$ age em $\Omega$ pela ação $(v,g)\mapsto vg$ para todo $v\in \F^n$ e $g\in G$.
- Seja $G\leq GL(n,\F)$ e seja $\Omega=\{\left<v\right>\mid v\in \F^n\setminus\{0\}\}$. O conjunto $\Omega$ é chamado de espaço projetivo. O grupo $G$ age em $\Omega$ e a ação é $(\left<v\right>,g)\mapsto \left<vg\right>$ para todo $v\in \F^n$ e $g\in G$.
- Seja $G$ um grupo arbitrário e seja $\Omega=G$. O grupo $G$ age em $\Omega$ pela ação $(x,g)\mapsto xg$ para todo $x\in \Omega$ e $g\in G$.
- Sejam $G$ um grupo $H\leq G$ e $\Omega=\{Hg\mid g\in G\}$. O grupo $G$ age em $\Omega$ e a ação é $(Hx,g)\mapsto Hxg$ para todo $Hx\in\Omega$ e $g\in G$.
- Seja $G$ um grupo e ponha $\Omega=G$. Então $G$ age em $\Omega$ pela ação de conjugação: $(x,g)\mapsto x^g=g^{-1}xg$.
Assuma que $G$ age em $\Omega$. Defina a seguinte relação $\equiv$ sobre $\Omega$. Se $\alpha,\beta\in\Omega$ então $\alpha\equiv\beta$ se existe $g\in G$ tal que $\alpha g=\beta$.
Exercício. A relação $\equiv$ é uma equivalência.
As classes de equivalência da relação $\equiv$ são chamadas de órbitas. Se $\alpha\in\Omega$, então por definição, a órbita que contém $\alpha$ é o conjunto
\begin{eqnarray*}
\alpha G&:=&\{\beta\in\Omega\mid \alpha\equiv \beta\}\\&=&
\{\beta\in\Omega\mid \beta=\alpha g\mbox{ com algum $g\in G$}\}\\&=&
\{\alpha g\mid g\in G\}.
\end{eqnarray*}
Se $G$ age em $\Omega$, então as órbitas de $G$ em $\Omega$ formam uma partição de $\Omega$.
Exemplo. Assuma que $G=GL(n,\F)$ e considere a ação de $G$ em $\Omega=\F^n$. Então $G$ tem duas órbitas em $\Omega$; nomeadamente, $\{0\}$ e $\Omega\setminus\{0\}$.
O grupo $G$ é dito transitivo se $\Omega$ é uma órbita de $G$. Equivalentemente, $G$ é transitivo em $\Omega$, se para todo $\alpha,\beta\in\Omega$, existe $g\in G$ tal que $\alpha g=\beta$.
Exemplo. Seja $G=GL(n,\F)$ e considere a ação de $G$ sobe o espaço projetivo $\{\left<v\right>\mid v\in \F^n\setminus\{0\}\}$. O grupo $G$ é transitivo sobre $\Omega$.
Dado $\alpha\in\Omega$, definimos o estabilizador de $\alpha$ em $G$ como
\[
G_\alpha=\{g\in G\mid \alpha g=\alpha\}.
\]
Exercício. $G_\alpha$ é um subgrupo de $G$.
Exemplo. Considere a ação de $G=GL(n,\F)$ sobre $\Omega=\{\left<v\right>\mid v\in\F^n\setminus\{0\}\}$. Seja $\alpha=\left<(1,0,\ldots,0)\right>$. Então o estabilizador $G_\alpha$ é o subgrupo de matrizes na forma
\[
\begin{pmatrix} a & \underline 0\\ \underline u & B\end{pmatrix}
\]
onde $a\in\F\setminus\{0\}$, $\underline 0\in\F^{n-1}$ é o vetor nulo, $\underline u\in\F^{n-1}$ e $B$ é uma matriz $(n-1)\times(n-1)$ invertivel.
Assuma que $\Omega$, $G$, e $\alpha\in\Omega$ são como acima. Para, $\beta\in \alpha G$, considere o conjunto
\[
G_{\alpha\to\beta}=\{g\in G\mid \alpha g=\beta\}.
\]
Observações.
- $G_{\alpha\to\alpha}=G_{\alpha}$ é um subgrupo de $G$.
- Como $\beta\in \alpha G$, o conjunto $G_{\alpha\to\beta}\neq\emptyset$.
- Seja $g\in G_{\alpha\to\beta}$ e $h\in G_\alpha$. Então
\[
\alpha(hg)=(\alpha h)g=\alpha g=\beta.
\]
Ou seja, $hg\in G_{\alpha\to \beta}$. Isto quer dizer que a classe lateral $G_\alpha g$ está contido em $G_{\alpha\to\beta}$. - Seja $x$ another elemento de $G_{\alpha\to\beta}$. Então
\[
\alpha (xg^{-1})=(\alpha x)g^{-1}=\beta g^{-1}=\alpha.
\]
Ou seja $xg^{-1}\in G_\alpha$, ou seja $x\in G_\alpha g$. Isto implica que $G_{\alpha\to\beta}\subseteq G_\alpha g$. - As duas observações anteriores implicam que $G_{\alpha\to\beta}=G_{\alpha}g$ onde $g\in G$ tal que $\alpha g=\beta$. Ou seja, o conjunto $G_{\alpha\to\beta}$ é uma classe lateral de $G_\alpha$. Em particular, esta correspondência dá uma aplicação $\varphi:\alpha G\to \{G_\alpha g\mid g\in G\}$.
Lema. Usando a notação introduzida acima, a aplicação $\varphi:\alpha G\to \{G_\alpha g\mid g\in G\}$ está bem definida e ela é uma bijeção entre $\alpha G$ e $\{G_\alpha g\mid g\in G\}$.
Demonstração. Boa definição: Assuma que $g_1,g_2\in G$ tais que $\alpha g_1=\alpha g_2=\beta$. Então $g_1g_2^{-1}\in G_\alpha$ e isto implica que $G_\alpha g_1=G_\alpha g_2$. Logo, a aplicação $\varphi$ está bem definida.
Sobrejetiva: Se $G_\alpha g$ é uma classe lateral de $G_\alpha$, então $G_\alpha g=\varphi(\alpha g)$.
Injetiva: Assuma que $\beta_1,\beta_2\in \Omega$ tais que $\varphi(\beta_1)=\varphi(\beta_2)$. Então existem $g_1,g_2\in G$ tais que $\beta_1=\alpha g_1$ e $\beta_2=\alpha g_2$. Mas pela definição de $\varphi$,
\[
G_\alpha g_1=\varphi(\alpha g_1)=\varphi(\beta_1)=\varphi(\beta_2)=\varphi(\alpha g_2)=G_\alpha g_2.
\]
Ou seja, $g_1g_2^{-1}\in G_\alpha$. Mas isto implica que $\alpha g_1g_2^{-1}=\alpha$ e que $\beta_1=\alpha g_1=\alpha g_2=\beta_2$. Portanto o mapa $\varphi$ é injetivo.
Teorema (Teorema Órbita-Estabilizador) Assuma que um grupo finito $G$ age transitivamente em um conjunto $\Omega$ e seja $\alpha\in\Omega$. Então $|G|=|G_\alpha||\Omega|$. Em particular $|\Omega|$ é um divisor de $|G|$.